sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Personagens da Solidão

Tema:

A solidão (não) é uma escolha do ser humano.

“Personagens da Solidão”, foi e é uma crónica literária, realizada para a disciplina de Português.

 

 

Sentada à mesa do canto da biblioteca, encaro as lombadas dos imensos livros. Tudo é silêncio à minha volta. Estou só com os meus pensamentos e um punhado de palavras prestes a fugirem-me da imaginação. Olho a estante à minha esquerda, repleta de títulos de obras encadernadas em capas marcadas pelos anos. Salta-me a vista, inesperadamente, um cavaleiro fantástico que passa por uma bela dama de vestido e chapéu a condizer. Cumprimentam-se. A sena, como num filme transposto para a realidade, desenrola-se diante mim. De repente, atempadamente, como aqueles, mais personagens abandonam os livros. Vejo-os, mas, nenhum deles parece ver-me. Como que a espiá-los permaneço ali, torcendo para que não partam e sobre tudo, para que ninguém, para além de mim entre na biblioteca da casa.

Continuando a observá-los, vejo saírem mais personagens vindas de livros dos mais variados estilos, séculos, épocas e autores. Nada parece fazer-me sentido. Concentro-me nas suas conversas, nas suas manifestações de reencontro. E eis que dou por mim a percebê-los. Precisam-se. Fartaram-se da solidão de cada mundo impresso nas páginas dos seus livros. Cansaram-se de não se sentirem acompanhados por quem não os lê. Cansaram-se da solidão e da sisudez da biblioteca e saíam cá para fora a fim de se procurarem e de se encontrarem para além das páginas dos seus livros, onde nascem e findam para cada um dos seus leitores ou, onde permanecem invisíveis e sós para quem deles não quis, nem quer saber.

Há um velho ancião saído de um livro que me nota. Aproxima-se de mim e sussurra-me: «Talvez agora não nos esqueças. Mas há quem nos esquece e assim permanecemos sós, uns com os outros, nos respetivos livros, mas sem quem nos queira ler…» Compreendo-o e, como não o compreender? Aceno afirmativamente e silenciosamente com a cabeça, e ele continua: «Assim segue o mundo… A solidão é uma besta. Tanto pode ser escolha como imposição. Ou se escolhe ficar só, ou se escolhe fugir dessa realidade vazia que é estar sozinho. Ou então, impõem-nos ficarmos sós, como é o caso de todas estas personagens que vês. Quando chegar à hora, voltamos para os livros e ficamos sós, até que chegue, se chegar, o próximo leitor. Quem sabe…»

Vira-me as costas e como os outros, parte. Da última prateleira ouço-o ainda dizer: «Se deixarmos, a solidão não parte…» Entendo-o e, detenho ca pra mim que ainda nos havemos de encontrar, nem que seja pelo motivo de não ficarmos demasiado sós, como ficamos por tanta vez…

 

 

*

 

 

3 comentários:

  1. Anónimo14:36:00

    Olá, adorei a ideia que conceptualizaste para este texto, genial, curiosamente gostei menos da prosa, ou seja, da forma como a transpuseste para o papel, mas muito bom na mesma....

    abr

    Rui

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    1. Grata, Rui, pela tua opinião. É muito engraçado, que já não é a primeira vez que me é dito isso, de ser muito melhor a escrita na poesia, do que na prosa. Fico contente que tenhas sentido e compreendido a ideia desta pequena crónica literária. Obrigada por tudo, mais uma vez! Abreijo!

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    2. Anónimo10:25:00

      De mim terás sempre a opinião sincera, essa é que tem valor no meu entender! Mas sim, a ideia é fantástica, não deixes de continuar a prosar, mas és melhor como poetisa, na minha opinião.

      beijinho

      Rui

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Ao meu lado existe o vosso lado, e aqui é o vosso espaço. Desejo imenso ler-vos !